25 julho 2010

APESAR DO MEDO

[Imagem: Felipe Santos]

Vivemos com tantas preocupacões – da gordura trans, de perder o emprego, de estranhos, da crise mundial –, a tal ponto que dizem que vivemos numa Era dos Temores. Não precisa ser assim. Podemos aprender a lidar com nossos medos. Não é fácil, mas é bem possível

[ Elisa Correa ]

Medo dos outros - Resolvi pegar um táxi para conversar com um motorista sobre o medo dos outros. Como pode alguém abrir, toda noite, seu carro para um desconhecido numa cidade como São Paulo? Encontrei alguém com mais medo de se jogar no mundo que de abrir as portas do táxi. Lau Gasparotto é um taxista de 45 anos que não tem medo de passageiro e sim medo de casar. Em 12 anos de profissão nunca foi assaltado, ao contrário dos muitos colegas que já perderam a conta das vezes que sentiram uma arma encostada na cabeça. Para diminuir os riscos, Lau começou a trabalhar com o radiotáxi, porque tem ao menos uma referência do passageiro que vai transportar. E para diminuir os riscos de sofrer de amor? Lau decidiu que não vai mais casar.

“Eu já fui casado, tenho duas filhas, mas separei. Não quero casar por puro medo: medo de essa nova pessoa não se adaptar a minha vida, medo de ela atrapalhar a relação com minhas filhas.” O taxista, que lamenta ter deixado o curso de psicologia pela metade, diz que hoje tem mais receio de casar que de ficar sozinho. “Eu vou logo avisando que comigo não tem compromisso. Aviso para a outra pessoa e para mim mesmo.”

Quem tem medo pensa em muros. Não importa se de concreto, para proteger nossas moradas, ou invisíveis, uma barreira entre nós e os outros. Com medo da violência abandonamos as ruas e procuramos abrigo em condomínios, apartamentos, shopping centers, carros blindados.

Com medo do que o outro possa fazer, adotamos uma postura autodefensiva, desconfiamos antes de confiar, andamos para trás em vez de tentar. Para Flávio Gikovate, é normal sentir medo dos outros nos dias de hoje, apesar de esse ser um medo que existe há muito tempo.

Mas se lá no passado a divisão entre amigos e inimigos era mais definida, feita por critérios como raça, religião e pátria, hoje a confiabilidade depende da percepção que temos do caráter das pessoas. “Se antes confiávamos nas pessoas até que se provasse o contrário, hoje desconfiamos sempre. E com razão. As relações de amizade estão muito complicadas, é difícil separar o que é amizade do que é interesse”, diz Gikovate.

Mas o que fazer então:

evitar as calçadas e os encontros?

Fechar as portas do coração?

Bem, quem já se queimou ao colocar a mão no fogo evita chegar perto de um fogão de novo.

Não tem jeito, as experiências passadas estruturam nosso comportamento para garantir a sobrevivência. Quem não consegue estabelecer relacionamentos com ninguém, porque sente medo da rejeição, na verdade queria muito estar com os outros, mas se afasta quando alguém se aproxima. E precisa de ajuda.

Para aqueles que acham que seus temores andam crescendo quase a ponto de paralisar, é preciso desenvolver a coragem, essa força racional capaz de ultrapassar o medo. “Mas não vencê-lo”, lembra Gikovate. “A gente não vai sem medo, a gente vai apesar do medo."

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts with Thumbnails